sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O Terceiro domingo (dezembro de 2009)

Um sonho que tive e que alguém sensível, na época, me disse que anotasse:



Ela estava linda, ótima, de rosa claro tipo pijaminha sentada com as pernas cruzadas sobre uma cama branca, alta, enorme. Havia um altar.



Tive a impressão que estávamos todos nós, nós, nós ali em volta. Eu não nos via. Só ela. Sua voz era tranquila, didática, carinhosa, mas ao mesmo tempo um pouco dura, assertiva:



“Eu amo vocês e tenho muito que falar com vocês, mas eu tenho um compromisso, eu preciso ir. Tenho apenas mais dois dias...”



E eu lembro de no sonho pensar... “Por que dois dias?”

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Atenas

Último dia da primeira escala. Predinhos de quatro ou seis andares, bichas lindas borboleteando, guardas lindos de cinema (até os de trânsito), o sol refletindo nos ornamentos jônicos, dóricos e coríntios no meio de taxis amarelos, por onde toda comida contém berinjela. Você sempre pode ver as pontas das colunas do Templo de Zeus, imenso, destruíto, no meio, de qualquer lado. Relevos de toda ordem e modelo, queijo feta, tudo branco, branco. As Cariátides de lindos vestidos, com seus cabelinhos de trancinhas e sem braços, ali, só sendo lindas e mais nada. Ali desde muito tempo. A crise aparece, limita bairros bons, bairros ruins, mas tem um clima de será, e agora?, meio que esperando uma dica para dar o próximo passo. Percorremos, aprendemos, comemos. Não dá para saber ao certo. Acabou o tempo, taxi para o hotel e avião, uma surpresa do lado esquerdo. Num muro imenso vemos traços conhecidos, uma coisa esquisita tipo labirintite, onde estamos mesmo? Os Gêmeos e Nina Pandolfo haviam passado por ali.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Meu eterno romântico

Se ele estivesse aí, haveria música, uísque e um bom livro. Ele saberia os resultados dos esportes e torceria pelo time rival se, por acaso, o time rival representasse o Brasil em algum desses campeonatos que, depois dele, me parecem tão sem sentido. Se a gente estivesse aí, ele desapareceria como mágica no meio da refeição e gata dormiria em seu colo sempre que ele estivesse na poltrona. Se ele estivesse por aí, pouco ouviríamos da sua voz, mas no ar haveria música e essa música, com certeza, cantaria o amor.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Kiprocó no metrô


A aluna bonitinha de caderno cor-de-rosa, aquela mesma que sentava na frente e anotava tudo com canetas multicolores e que o namorado bonitinho buscava pontualmente depois da aula, chegou naquele dia esbaforida e escalavrada. Aconteceu que havia sofrido um turbulento quase assalto no terminal do metrô. Uma baranga vigarista de unhas azuis e barriga de fora havia tentado roubar em meio ao mar de gente seu celular cor-de-rosa. Atracaram-se a bonitinha e a baranga na boca da escada que rolou vazia por quase um minuto inteiro entre as 18h31 e as 18h32 de uma quarta-feira pela primeira vez desde 1985, para deleite dos trabalhadores cansados e estudantes passivos que desembarcavam naquele momento único do terminal Barra Funda. O bate-boca inicial durou pouco, mas o suficiente para que elementos variados do público bem posicionado garantisse o up-load do dia seguinte daquele barraco para o mundo youtubiano. Em segundos estabeleceu-se um show de arranhões e decotes entre as duas cores distintas de cabelos alisados. O público estava dividido, alguns torciam para a bonitinha e outros para a baranga, de acordo com os processos misteriosos de identificação pessoal. Um grupo de adolescentes tentou puxar um grito de “beija! beija!”, mas não pegou. A bonitinha mostrou-se mais ágil do que o esperado e, mesmo de salto fino, conseguiu rapidamente derrubar a bolsa plastificada da baranga de onde foram cuspidos oito moderníssimos telefones celulares, dois iPODs e mais um aparelho eletrônico que a narradora tecnologicamente atrasada não seria capaz de nomear. Uma senhorinha minúscula gritava “o meu é o brubérri!”. Só nesse momento específico, após o vazamento de eletrônicos, foi que o segurança resolveu participar. Pensou em intervir antes, mas lembrando-se do último domingo de Páscoa na qual havia aprendido na prática a não se meter em briga de mulher, conteve-se. Algumas coisas são sagradas, principalmente quando aprendidas em dias sagrados. A bonitinha resgatou de imediato seu super aparelhodesomcalculadoragendamaquinafotograficaquemandamensagens cor-de-rosa (que às vezes também até faz ligação), consertou o decote e bravamente partiu para a faculdade com a saia meio torta. A baranga já havia desaparecido antes mesmo do decote da outra voltar ao lugar. Já na sala de aula, em meio ao apoio moral de colegas indignados, a bonitinha ainda ofegante resolveu avaliar o estrago material. Aconteceu que, para a surpresa de todos, na sua bolsa cor-de-rosa a bonitinha encontrou dois aparelhos idênticos de telefonia celular, ambos cor-de-rosa.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Festas...

Da série, pequenos prazeres...
A vida judia, a gente acostuma, aprende a gostar. Na adolescência era um sufoco obrigatório mas, pensando bem aqui de longe, tudo na adolescência foi um grande drama visceral e a vida social não poderia ser diferente. Com anos, desencantos e a prática, a brincadeira foi ficando cada vez mais interessante, fonte de pesquisa, diversão de voyeur, até virar um hobby um tanto cruel. Ando sem treino, curtindo outra vida, mas acho que é como andar de bicicleta. A última festa na qual estive foi assim. Como era de costume, a posição estratégica e inofensiva de amiga de uma convidada facilitou o movimento. Logo após as apresentações obrigatórias, passei pela cozinha, já de olho na espetacular área externa, que só não é melhor do que uma boa biblioteca, e que naquele dia, era mais do que o necessário. Fetiches a parte, era noite de lua, daquela que mexe com a água interna como se fosse maré e faz a cabeça virar mar. Nas ondas do caminho, o olhar e a pergunta - oi, tudo bom? um drink? – Uns três segundos de olhar segurado só pra incomodar um pouco mais sempre garantiram o bom resultado. Sorri – desculpe, mas não bebo – e aguardei o abandono de cena, já previsto e apreciado. A maré levou. Roubei uma água com gás e deslizei incógnita por entre os convivas a degustar meu puro e calculado isolamento, ainda sentindo o gosto de travessura colado na língua. Olhar externo, ângulo interno. Melhor que TV.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Lama minha

A tristeza física pesa demais no peito, embaça demais a vista e distorce tudo que a gente pensa ser o mundo. É ver só o negro da lua e apagar as estrelas sem consideração. Não se sai sozinho desse buraco. O amor não salva mas, enquanto vida, justifica-a.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Eleita

Ela ganhou e eu sei lá o que vem por aí. Não acredito em nada desses projetos de campanha e acho que qualquer partido ou pessoa tem seu lado perigoso. Não sei bem o que esperar e, realmente, preferia saber. Pelo menos a democracia me garante o direito inalienável de reclamar de cada um dos tempos presentes que eu tenho a chance de vivenciar. O futuro nunca chega mesmo, deve ser uma lei universal. Mas votar em quem perde não deixa de ser um pequeno luxo, pois mantém o pessimismo nosso de cada dia na categoria "coerente". Bons próximos quatro anos a todos...