O sofrido Natal já era passado e aquela semana de bônus de fim de dezembro parecia ao mesmo tempo longa e curta demais. Constatou com alguma amargura e nenhuma surpresa que os trajes de banho arquivados desde o último verão já não eram mais os mesmos. O tempo é implacável. Haviam envelhecido no fundo da gaveta, sozinhos. Não haveria para ela nenhuma escapatória: deveria quebrar seu delicioso momento de ócio pouco criativo e enfrentar o trânsito esquisitamente calmo para obter algumas peças fundamentais para as iminentes e merecidas férias. Respirou fundo e foi.
A confusão manobrística estabelecida na porta do local já prenunciava aquele clima agressivo do consumismo feminino que só os bastidores de fashion week podem de longe às vezes mimetizar. Entrou logo, sem muito pensar. O âmago da loja abrigava no mínimo três dezenas de mulheres de idades variadas unidas e ao mesmo tempo separadas por um único objetivo: enfrentar dignamente o campo de batalha arenoso que geralmente chamamos de praia. As camisetas verde-bandeira facilitavam a identificação das vendedoras que atendiam clientes múltiplas com a mesma atenção que os mergulhadores de snorkel dedicam aos peixinhos prateados dos cardumes. Atrás das velozes camisetas verde-bandeira viam-se gigantescas prateleiras onde torres de partes de baixo e partes de cima encontravam-se classificadas pelas dolorosas letrinhas P, M e G. Com alguma atenção o observador poderia ainda encontrar algum resquício da divisão clássica e sempre funcional do tipo “por modelo”. No balcão, as clientes histericamente debruçadas remexiam as coloridas pilhas de lycra enquanto seus adoráveis filhos corriam felizes por entre cestinhas de plástico e vendedoras e prateleiras e lycra (meu Deus, quanta lycra!). O emaranhado de vozes não permitia nenhum tipo de conversação civilizada. Era um tal de tem de cortininha dessa cor? ou não tem dessa só que mais clara? eu quero uma cor assim sabe... mais alegre! mãe, mãe, mãe! compra pra mim! será que a tia usa uma saída dessa estampa? Mocinha, tem alguém aqui para me atender? ah não acredito que não tem mais desse shortinho! Sério? Procura pra mim...
Bravamente e com sua objetividade de caçadora ela comprou o que tinha que comprar e saiu para rua aliviada. Ao respirar o ar poluído da tranquilidade que precede a virada ela ainda deu uma olhada para trás e pensou:
- Jesus, quanta mulher feia!
Das insônias de fim de ano
Há 8 anos